quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Jornal ou Blog de Angola?


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O Jornal de Angola publicou um especial, no qual um bloguista brasileiro radicado na Suécia, Wellington Calasans, realça o papel de destaque de Angola na cena política guineense. Como o Jornal de Angola nem sequer apresenta o analista e este é desconhecido dos guineenses (só se lhe conhece um artigo de pura propaganda pró-DSP), ainda antes de abordarmos a parcialidade do conteúdo, justifica-se que o queiramos conhecer melhor, para aferirmos da legitimidade das suas alegações e tentar perceber qual o alcance, a intencionalidade e a actualidade do presente especial no jornal oficial. São feitas insinuações, prognósticos e mesmo ameaças veladas dificilmente imputáveis a uma política diplomática responsável, no campo internacional: como lidarão as autoridades angolanas com o futuro presidente, se o povo guineense, que é quem deve decidir, optar por outra solução para além daquela que tão empenhadamente preconizam? Pretendemos, com este texto, denunciar o autor, o mandante, o editor, e, em última instância, os responsáveis políticos, pelo absoluto desrespeito demonstrado pela soberania do povo guineense. 

Atendendo ao destaque dado ao autor, profundidade e actualidade diplomática do assunto, suposta responsabilidade e credibilidade que empresta a publicação num jornal oficial como o Jornal de Angola, seria de esperar tratar-se, no mínimo, de alguém com um curso de jornalista. No entanto, trata-se de um simples bloguista brasileiro, caído em desgraça no seu país. Em tempos defensor acérrimo de Lula, teve o seu momento de glória, mas o poder mediático que rapidamente adquiriu o blogue/conceito de directos de opinião (Duplo Expresso, que desenvolveu em parceria com um outro bloguista, Romulus Maya) rapidamente hipertrofiou a sua inata megalomania. O seu patrono, que o lançou e apoiou inicialmente no conhecido blog brasileiro Cafezinho, Miguel do Rosário, sentiu-se obrigado a publicar um documento público esclarecendo o seu “nível inacreditável de mau carácter e insanidade”, acusando Wellington Calasans de “irresponsável, truculento e desonesto”.

Quanto ao seu parceiro no Duplo Expresso, a pesquisa revela-se mais surpreendente ainda, expondo as suas conexões a Angola: um jornalista brasileiro, Luís Nassif, apresenta-o em “o estranho caso do advogado internacional que virou blogueiro”, revelando que este fez parte da equipa que preparou a entrada da Trafigura em Angola (monopólio de combustíveis), ou seja, como implicado nas actuais redes de corrupção do “novo” regime angolano pós-Eduardo dos Santos, acrescentando que as investigações Lava Jato pouparam misteriosamente as ramificações angolanas do escândalo da PetroBras à Trafigura. Romulus de seu nome, é descrito por Miguel do Rosário como “uma pessoa completamente desequilibrada, que não tem a mais leve noção de ética (…) uma pessoa com graves problemas mentais. Suas observações sobre ‘uai, precisa de fonte?’ são estarrecedoramente antiprofissionais, mesmo para um não-jornalista.” É ainda descrito como “vaidoso”; “mentiroso”; “chantagista”; “sórdido”; “vingativo”; “perigoso”, entre outros mimos pouco abonatórios para a sua personalidade. 

Ambos os personagens estiveram envolvidos em quezílias sobre financiamento de blogues, sendo apontados como oportunistas e demagogos. Alguns acusam expressamente esta dupla de traição, e mesmo de responsabilidade pela derrota de Lula, pelas sementes de discórdia e dissensão que espalharam entre as suas fileiras, actuando como quinta coluna do adversário. 

Ora se, no artigo prévio do autor em relação à Guiné-Bissau, já citado, se podiam ainda tratar de simples especulações de um bloguista, à pesca de patrocinador, já com a publicação num jornal oficial o caso muda de figura. Presume-se que, num assunto tão melindroso, não haveria publicação sem aval superior, ou pelo menos conhecimento a algum nível da máquina diplomática, nomeadamente o embaixador... A megalomania, bem identificada no autor, parece ter sido naturalmente bem acolhida em Luanda. Ora é precisamente isso que é preocupante: o novo regime angolano parece dar crédito a pessoas pouco recomendáveis, em assuntos muito sensíveis. 

O bloguista agradece, na sua página pessoal do FaceBook, a colaboração de várias pessoas na visão que oferece neste “especial”, entre elas, Geraldo Martins, Ministro do actual Governo. O ponto de vista inteiramente parcial, a ausência de contraditório, o absoluto anonimato das fontes (associado ao do autor), desclassificam obviamente a peça do ponto de vista da deontologia jornalística, situando-a claramente no campo da propaganda. Parece indubitável que o pretenso jornalista fala em nome das autoridades angolanas, ao serviço exclusivo de um candidato às próximas presidenciais na Guiné-Bissau. 

O especial começa por relembrar as pretensões de Angola, de há uns tempos para cá, sempre em conluio com DSP, de pressionar a CEDEAO a aceitar uma MISSANG II, com base numa imposição da União Africana, presidida/controlada precisamente por Angola. A ideia parece ser bajular o leitor angolano, o qual não tem qualquer ideia (nem teve, na altura da MISSANG I, assunto que foi completamente abafado) dos renovados projectos expansionistas de Angola a norte do Equador. 

Já que um brasileiro, radicado na Suécia, num jornal angolano, nos trata a nós, guineenses, como povo irmão, façamos um exercício de fraterna reciprocidade: imaginemos por um instante que o governo guineense tinha tomado partido por Samakuva, três meses antes das últimas eleições presidenciais; teriam as autoridades angolanas reagido com a mesma passividade que as guineenses? 

Este especial tem dois visados, Jomav e Cadogo, concebidos como os potenciais adversários de DSP numa eventual segunda volta (que o autor deste especial julga miraculosamente dispensável, se Angola se apressar a cobrar de volta os badalados doze milhões de dólares). O PAIGC de DSP pretende apresentar-se (seria mais apropriado impor-se) como virtual e inelutável vencedor das presidenciais de 24 de Novembro. Para criar essa convicção chega ao cúmulo de denunciar futuros golpes contra a sua presumida vitória.

A maquiavélica e demasiado óbvia intenção de colocar os dois ex-governantes, Jomav e Cadogo, em choque, para que se desgastem mutuamente, beneficiando DSP, que ficaria a assistir da bancada, omite contudo alguns aspectos importantes, dando provas de total demagogia. Confunde os leitores angolanos sub-informados, a quem parece que os vazamentos apanharam os dois a falar um com o outro. Ora, a questão é tudo menos nova, como o bloguista a apresenta. Pois, não foram os dois que se acusaram mutuamente, como sugerido, foi o PAIGC que lançou a questão muito convenientemente na ordem do dia e na agenda dos jornalistas. Por um lado, a acusação já foi invocada contra Jomav, tendo sido o PAIGC de DSP quem lhe limpou a ficha e o colocou no lugar que ocupa; por outro, o jornal oficial angolano mostra ter memória curta, pois está a trair o antigo aliado, o que fica sempre feio, feito de forma tão descarada. 

Aliás, nesta história de traições, a verdadeira dupla parece ser Jomav e DSP, que deram provas de mal agradecidos em relação a Cadogo, que os alçou ao seu estatuto cimeiro. O autor do artigo torna-se patético quando sugere que o dinheiro “constitui um prejuízo financeiro aos cofres públicos angolanos” e fala na sua “cobrança”, dando como exemplo a luta contra a corrupção em Angola. Bom. Brincadeira tem hora…

Na sua propaganda, o bloguista entra no campo da ficção quando cita Cadogo: trata-se sem dúvida de uma pretensa citação pois encontra-se entre aspas, constituindo portanto grave calúnia e sendo passível de procedimento criminal. É óbvio, para quem conhece a personalidade de Carlos Gomes Júnior, que nunca se exprimiria dessa forma, primeiro porque não admitiria “cair”, depois, por lhe ser indiferente, de todo o modo, o destino de Jomav. O ex-bloguista está a usar dos mesmos sórdidos métodos de mentira, que levaram à sua unânime condenação na blogoesfera brasileira. As suas divagações seriam inócuas sem o carimbo oficial de Angola, tornando-se assim numa ingerência nos assuntos internos da Guiné-Bissau. 

Todavia, não serão um punhado de bajuladores, de serviço em Luanda, que virão dar lições de moral e de democracia aos guineenses. O povo angolano sofre, como o guineense, da péssima qualidade das suas elites políticas: o nível de descrédito a que chegaram é proporcional ao destaque dado a este outsider oportunista e sem escrúpulos.

2 comentários:

  1. Os meus parabéns ao/à editor/a/equipa deste novo blog. Julgo que o anonimato prejudica a eficácia da mensagem, mas posso compreender as vantagens em termos de margem de manobra. Felicitações igualmente pela inclusão das fontes, credibilizando as acusações efectuadas. Apenas para dois comentários soltos e jocosos sobre os links: 1) para onde está a apontar o arqueiro, na página do Expresso? 2) o bloguista nem sabe escrever português: agradece aos entrevistados com um "sou grato"; ó Wellington, já nasceste assim? A tua gratidão é inata? O português não se constrói como o francês, ó aculturado. Diz-se "estou grato" (pontualmente, nesta situação). Nisto de erros, nem vale a pena corrigir as incorrecções do especial do Jornal de Angola, onde devem julgar que basta o visto do corrector ortográfico virtual...

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  2. Wellington e Romulus são de facto uns aproveitadores e 'penas pagas'. Aqui no Brasil não têm expressão alguma, salvo por um pequeno grupo de fanáticos que não questionam suas acusações sem provas e suas ilações venenosas. Abraço carioca!

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